Uma tentativa de me conhecer. Talvez tenha sido a primeira…

Parei de tomar anticoncepcional, depois de nova anos consecutivos, após a gestação da Maria Catharina, que hoje já está com onze anos.

Saí da ginecologista com o pedido de meu companheiro Tiago de não colocar o DIU. Diante da fala da médica de possível alteração de fluxo sanguíneo menstrual, e que em cinco anos não seria viável eu pensar em gestação saí de lá convencida a não tomar mais pílula e também a não colocar o DIU. Com os exames de rotina, uma novidade: um caroço no seio esquerdo. Um pedido de exame de imagem.

Com o exame de imagem e a confirmação de uma “anomalia” no seio esquerdo, na mesma sequência, um pedido de biópsia. Eu jurava que estava morrendo. Eu tinha certeza que era um câncer em estágio avançado… meu cérebro já não fazia cálculos lógicos. Eu já estava estafada depois de quatro anos de pesquisa no doutorado, depois de uma eleição que prometia destruir todas as políticas públicas relacionadas ao meio ambiente e à educação… agora essa: eu estava com um câncer de mama e morreria em pouquíssimo tempo.

Eu já conversava falando de mim mesma no passado. Estava dando por certa a minha morte. Fiz a biópsia, e no exame a médica me perguntara se havia muito tempo que eu colocara a prótese de silicone… respondi que não era uma prótese… era o caroço… um caroço de 6×8 centímetros. Fiz a biópsia na sexta-feira, dia 15 de fevereiro de 2019, e fui para a banca de defesa de minha tese de doutorado no dia 18 de fevereiro, jurando que estava com câncer de mama. Meu orientador da tese não pôde estar presente, pois estava em tratamento de quimioterapia por um câncer de próstata. Eu tinha certeza que tudo aquilo estava ligado. Entregue.

Saiu o resultado da biópisa… não era um câncer… era um “caroço de gordura”… “fique ai caroço… eu vou tirar você agora, vou limpar meu corpo, vou ser crudivegana, só vou comer comida orgânica… vou tirar o caroço e colocar silicone… vou emagrecer e ficar saudável (em minha cabeça que jurava que saudável e magra eram praticamente sinônimos)… “Vou mudar de vida!!!!”

Chás, esperando a menstruação descer… acupuntura, moxabustão, drenagem… fiquei inchada sem o anticoncepcional, mas a médica disse que aconteceria… engordei, fiquei mais lenta… acne… “é meu organismo se limpando dos anos de hormônio sintético”… mais drenagem linfática, mais chá… espera a menstruação descer “eu te acolho, sangue!”

Nada de menstruação… um dia, Sebastião já cansado de dar avisos, me fez sentir nojo do cheiro do pai dele… foi imediato: “tô grávida Tiago!”… essa afirmação foi seguida de descrença do Tiago… exame de farmácia: positivo… pedido de exame de ultrassonografia: um punhado de células lindas, meu  Sebastião!!!

Como pode? Eu achei que era morte! Mas era vida!!!!

Eu achei que estava no fim de tudo… estava tão enganada… Eu já insegura por ter experienciado a violência obstétrica aos vinte e quatro anos, no parto de Maria Catharina, já comecei a pesquisa por “partos humanizados”… fui parar em uma ginecologista referência no assunto em Porto Alegre… no terceiro mês de gestação um sangramento… fui chorando pro hospital e implorando para o Sebastião para que ele ficasse comigo. Prometendo ficar mais calma, prometendo pra ele fazer repouso… a médica me atendeu no hospital e na próxima consulta do pré natal me disse muitas coisas horríveis, entre elas que eu teria traumatizado Maria Catharina ao levá-la ao hospital no dia do sangramento. Me lembro de responder chorando a ela que eu não tinha família em Porto Alegre, e, portanto, não tinha com quem deixar minha filha… me lembro que saí muito abalada da consulta… não queria mais voltar ali… não confiava mais naquela mulher.

O sangramento durou uma semana, mas não havia nada de errado nem com o bebê, nem comigo, nem com a placenta.

Perguntei para minha doula querida sobre parto domicilar… começamos a estudar e pesquisar. Tiago estava inseguro e me recordo das negativas iniciais dele à ideia. Nossa doula nos passou contato de duas equipes. Entrei em contato com uma delas, que já enviou uma das enfermeiras para uma conversa conosco.

Na próxima visita do pré natal a médica já tentou me dissuadir de tentar o parto com a equipe que eu havia escolhido. Disse que não me acompanharia caso fosse necessário uma transferência de emergência de casa para a maternidade. Diante do ultimato eu parei de fazer o pré natal com ela e iniciei o acompanhamento com as enfermeiras em casa.

Eu já não estava segura naquela cidade. Naquele período histórico. Tudo que eu precisava era de um canto seguro para parir em paz. Eu senti insegurança todo o tempo pelo fato de ser vegana e diversos dos meus familiares serem contra a minha postura ética. Esta situação já foi motivo de briga diversas vezes em minha família e na família do Tiago. Eu me sentia pressionada a julgada todo o tempo. Era como se na menor possibilidade de algo dar errado eles apontariam o dedo e diriam: “está vendo o que esse negócio de não comer carne resultou?”… foi assim que eu me senti a gestação inteira… como se eu estivesse em uma cela de vidro, onde as pessoas que teriam “a obrigação” de ser nossa rede de apoio estava o tempo inteiro esperando algo dar errado para “eles terem razão”… mesmo que isso custasse a nossa alegria e a nossa saúde… foi adoecedor… Final da gestação chagando, decidimos mesmo parir em casa… preparativos… correria… às 22 horas do dia 20 de novembro de 2019, caiu o tampão. Mandei mensagem para uma das enfermeiras e para a doula, e elas começaram as organizações para irem para nossa casa. Às 00h do dia 21 de novembro já estavam todas lá: doula, enfermeiras e fotógrafa. As contrações, a dor, o Tiago, as velas, os gatos… Eu sonhava com o Sebastião escorregando, como em um dos vídeos de parto relâmpago que eu assisti na internet. O dia clareou e eu nem vi… lembro de pouca coisa nesse ínterim… lembro dos movimentos de organização de piscina se enchendo, me lembro do alívio que eu sentia quando a minha doula segurava meu quadril durante as contrações. No final, eu já não conseguia me afastar dela… me lembro das tentativas de uma das enfermeiras em me fazer mudar de posição para ver se o bebê se encaixava… fui da bola para os panos de pilates, dos panos para o banquinho, do banquinho para debaixo do chuveiro… parecia que ele ia descer debaixo do chuveiro… a bolsa arrebentou… gritaram o Tiago, que parecia estar na cozinha… lembro do “corre Tiago”… creio que tenha sido o mais próximo que cheguei do meu parto vaginal… mas a contração parou e ele subiu de novo. Daquele momento em diante eu não vi mais evolução. Eu sentia que faria pouca ou nenhuma diferença eu ficar ali fazendo força… e eu já não tinha força… já estava me sentindo fraca. Mas parecia para as pessoas em volta que eu ia conseguir.

Me lembro da minha mãe vindo pra perto de mim quando eu estava no banquinho no quarto chorando e segurando em mim. Me senti muito mal e gritei pra que tirassem ela dali. Por volta do meio-dia, uma da tarde, eu implorei que não queria mais… eu não tinha mais força para fazer durante as contrações… eu não sentia mais que o bebê mudava de lugar quando eu fazia força… Lembro que com minha lembrança ao Tiago de que “eu fui longe demais Tiago… eu nem sei como consegui chegar até aqui” não foram entendidos pelas demais pessoas… enfim… fomos para o hospital. Minha doula e uma das enfermeiras foram comigo no banco de trás do carro e me acompanharam. Quando fomos chegando a entrada do hospital eu tenho perfeitamente a ogeriza que eu sinto da burocracia… me separaram do Tiago, ele tinha que “preencher os papéis”. De novo… eu sentia desespero de ver que as pessoas em volta pareciam não se importar de eu estar sentada em uma cadeira de rodas gritando de dor. Isso me irritou, mas também acabou de abalar meu estado psicológico. Só consegui me acalmar novamente quando estávamos no quarto escuro, eu, Tiago e minha doula… eu já analgesiada.

Primeiro soco na gestante… alguém passou no corredore chamou minha doula… ela saiu e na volta entrou nomeu apartamento a médica que me acompanhou no meu pré natal, surgida como um fantasma ela entrou no quarto sem meu consentimento. Estava indo acompanhar o parto de outra  paciente. Entrou, se escorou em um móvel a minha direita e desferiu: “viu, eu te falei que com essa equipe eu não faria teu parto. Você vai ter que fazer com a plantonista. Eu vim fazer o parto de outra paciente, não vou poder te acompanhar”. Senti tanta raiva. Quem autorizou aquela mulher a entrar ali? E quem disse a ela que eu estava interessada que ela fizesse meu parto? Sinto raiva até agora, escrevendo isso…

Ela se foi. Continuamos ali, eu fazendo força quando a contração vinha. Mas o trabalho não evoluía. O Tião não encaixava. A médica plantonista me disse que eu já estava tempo demais em dilatação máxima. Ela me deu mais duas horas para parir ou me encaminharia para uma cesária. Eu pedi ajuda para Tiago e para a doula “vamos fazer esse parto nós três”… não adiantou… as duas horas passaram… o feito da analgesia passou…Tião não encaixou.

Comecei a ter um ataque de pânico quando a dor voltou e me disseram que eu ia pra cesária. Levaram o Tiago embora de novo, e a doula também se afastou. Olhava em volta e só via máscaras cirúrgicas. Comecei a berrar pelo hospital dizendo que estava morrendo, e, como em todo ataque de pânico, eu tinha a certeza que estava mesmo morrendo. As enfermeiras não conseguiam me segurar para a anestesista aplicar a medicação nas minhas costas. Eu pedi para não aplicarem, pois eu não ia ficar quieta. Não tenho ideia de quanto tudo isso demorou. Uma das enfermeiras teve a sensibilidade de falar mais calmo comigo, me alentou. Tiago ainda não havia chegado. A dor já não tinha mais distância entre um pico e outro, era ininterrúpta.

Tiago voltou. Fizeram o corte. Levaram o Tião embora sem encostar em mim. Tiago foi atrás dele.

A médica começou a pedir coisas às pessoas que a estavam auxiliando. Eu vi que pareciam nervosos. Ninguém me dizia nada. E Tião e Tiago ainda não haviam voltado. Eu sentia algo, como se estivessem me sacudindo por dentro… eu via panos e mais panos ensanguentados sendo jogados num canto no meu lado direito. Tião e Tiago voltaram. Beijei meu filho. Rapidamente levaram ele embora novamente. Tiago foi junto. A médica pediu com a voz impositiva pra alguém trazer a máquina de raio X. Me fizeram levantar o quadril e colocaram a placa de raio X debaixo de mim. Fizeram o exame ainda ali.

Depois disso, eu ainda atada ao soro e na mesma cama cirúrgica: “tudo que aconteceu aqui nessa cirurgia, 50% é sua responsabilidade”… depois de ouvir isso da médica eu me recordo de ficar atordoada, pois, até então em sabia o que estava acontecendo. Ela seguiu: “isso é resultado das escolhas que você fez”… “em uma cesária marcada e agendada não acontece esse tipo de coisa”… eu pressupus que ela estava falando sobre o fato de eu estar vindo do parto domiciliar.

Mais tarde, eu já encaminhada à enfermaria, em companhia do Tião e do Tiago, ouvi a médica orientando a enfermeira a observar com mais atenção a minha sonda de urina. Que se houvesse sinal menor que fosse de sangue, ela deveria ser avisada imediatamente.

Depois eu soube que durante a cirurgia meu útero não estava contraindo de volta, eu tive uma hemorragia e ela estava achando que poderia ter cortado a minha bexiga durante o parto. Foi apenas um temor dela. O exame de raio X e também a sonda limpa demonstraram que não havia corte na bexiga. Meu útero contraiu no pós-operatório ainda no hospital.

Sebastião não pegou meu peito. Mas ficou calmo no quarto. Estávamos calmos e felizes, apesar de tudo. No outro dia uma nutricionista descobriu que ele tinha a linguinha presa, e que não sairia da boca pra fazer a pega do mamá. No outro dia ele foi encaminhado pro centro cirúrgico e uma odontopediatra fez o corte no freio da língua.

Recebemos alta. Fomos pra casa… Tião demorou trinta e dois dias para fazer a pega no peito.

Neste meio tempo, tentamos todas as técnicas possíveis. Ele fará um ano no próximo sábado, ainda mamando em livre demanda.

Nágila

Uma tentativa de me conhecer. Talvez tenha sido a primeira…

Parei de tomar anticoncepcional, depois de nova anos consecutivos, após a gestação da Maria Catharina, que hoje já está com onze anos.

Saí da ginecologista com o pedido de meu companheiro Tiago de não colocar o DIU. Diante da fala da médica de possível alteração de fluxo sanguíneo menstrual, e que em cinco anos não seria viável eu pensar em gestação saí de lá convencida a não tomar mais pílula e também a não colocar o DIU. Com os exames de rotina, uma novidade: um caroço no seio esquerdo. Um pedido de exame de imagem.

Com o exame de imagem e a confirmação de uma “anomalia” no seio esquerdo, na mesma sequência, um pedido de biópsia.
Eu jurava que estava morrendo. Eu tinha certeza que era um câncer em estágio avançado… meu cérebro já não fazia cálculos lógicos. Eu já estava estafada depois de quatro anos de pesquisa no doutorado, depois de uma eleição que prometia destruir todas as políticas públicas relacionadas ao meio ambiente e à educação… agora
essa: eu estava com um câncer de mama e morreria em pouquíssimo tempo.

Eu já conversava falando de mim mesma no passado. Estava dando por certa a minha morte. Fiz a biópsia, e no exame a médica me perguntara se havia muito tempo que eu colocara a prótese de silicone… respondi que não era uma prótese… era o caroço… um caroço de 6×8 centímetros. Fiz a biópsia na sexta-feira, dia 15 de fevereiro de 2019, e fui para a banca de defesa de minha tese de doutorado no dia 18 de fevereiro, jurando que estava com câncer de mama. Meu orientador da tese não pôde estar presente, pois estava em tratamento de quimioterapia
por um câncer de próstata. Eu tinha certeza que tudo aquilo estava ligado. Entregue.

Saiu o resultado da biópisa… não era um câncer… era um “caroço de gordura”… “fique ai caroço… eu vou tirar você agora, vou limpar meu corpo, vou ser crudivegana,
só vou comer comida orgânica… vou tirar o caroço e colocar silicone… vou emagrecer e ficar saudável (em minha cabeça que jurava que saudável e magra eram praticamente sinônimos)… “Vou mudar de vida!!!!”

Chás, esperando a menstruação descer… acupuntura, moxabustão, drenagem… fiquei inchada sem o anticoncepcional, mas a médica disse que aconteceria… engordei, fiquei mais lenta… acne… “é meu organismo se limpando dos anos de hormônio sintético”… mais drenagem linfática, mais chá… espera a menstruação descer “eu te acolho, sangue!”

Nada de menstruação… um dia, Sebastião já cansado de dar avisos, me fez sentir nojo do cheiro do pai dele… foi imediato: “tô grávida Tiago!”… essa afirmação foi seguida de descrença do Tiago… exame de farmácia: positivo… pedido de exame de ultrassonografia: um punhado de células lindas, meu  Sebastião!!!

Como pode? Eu achei que era morte! Mas era vida!!!!

Eu achei que estava no fim de tudo… estava tão enganada…
Eu já insegura por ter experienciado a violência obstétrica aos vinte e quatro anos, no parto de Maria Catharina, já comecei a pesquisa por “partos humanizados”… fui parar em uma ginecologista referência no assunto em Porto Alegre… no terceiro mês de gestação um sangramento… fui chorando pro hospital e implorando para o Sebastião para que ele ficasse comigo. Prometendo
ficar mais calma, prometendo pra ele fazer repouso… a médica me atendeu no hospital e na próxima consulta do pré natal me disse muitas coisas horríveis, entre elas que eu teria traumatizado Maria Catharina ao levá-la ao hospital no dia do sangramento. Me lembro de responder chorando a ela que eu não tinha família em Porto Alegre, e, portanto, não tinha com quem deixar minha filha… me lembro que saí muito abalada da consulta… não queria mais voltar ali… não confiava mais naquela mulher.

O sangramento durou uma semana, mas não havia nada de errado nem com o bebê, nem comigo, nem com a placenta.

Perguntei para minha doula querida sobre parto domicilar…
começamos a estudar e pesquisar. Tiago estava inseguro e me recordo das negativas iniciais dele à ideia.
Nossa doula nos passou contato de duas equipes. Entrei em contato com uma delas, que já enviou uma das enfermeiras para uma conversa conosco.

Na próxima visita do pré natal a médica já tentou me dissuadir de tentar o parto com a equipe que eu havia escolhido. Disse que não me acompanharia caso fosse
necessário uma transferência de emergência de casa para a maternidade. Diante do ultimato eu parei de fazer o pré natal com ela e iniciei o acompanhamento com as enfermeiras em casa. Eu já não estava segura naquela cidade. Naquele período histórico. Tudo que eu precisava era de um canto seguro para parir em paz.

Eu senti insegurança todo o tempo pelo fato de ser vegana e diversos dos meus familiares serem contra a minha postura ética. Esta situação já foi motivo de briga diversas vezes em minha família e na família do Tiago. Eu me sentia pressionada a julgada todo o tempo. Era como se na menor possibilidade de algo dar errado eles apontariam o dedo e diriam: “está vendo o que esse negócio de não comer carne resultou?”… foi assim que eu me senti
a gestação inteira… como se eu estivesse em uma cela de vidro, onde as pessoas que teriam “a obrigação” de ser
nossa rede de apoio estava o tempo inteiro esperando algo dar errado para “eles terem razão”… mesmo que isso custasse a nossa alegria e a nossa saúde… foi adoecedor…
Final da gestação chagando, decidimos mesmo parir em casa… preparativos… correria… às 22 horas do dia 20 de novembro de 2019, caiu o tampão. Mandei mensagem para uma das enfermeiras e para a doula, e elas começaram as organizações para irem para nossa casa. Às 00h do dia 21 de novembro já estavam todas lá: doula, enfermeiras e fotógrafa. As contrações, a dor, o Tiago, as velas, os gatos… Eu sonhava com o Sebastião escorregando, como em um dos vídeos de parto relâmpago que eu assisti na internet. O dia clareou e eu nem vi… lembro de pouca coisa nesse ínterim… lembro dos movimentos de organização de piscina se enchendo, me lembro do alívio que eu sentia quando a minha doula segurava meu quadril durante as contrações.
No final, eu já não conseguia me afastar dela… me lembro das tentativas de uma das enfermeiras em me fazer mudar de posição para ver se o bebê se encaixava… fui da bola para os panos de pilates, dos panos para o banquinho, do banquinho para debaixo do chuveiro… parecia que ele ia descer debaixo do chuveiro… a bolsa arrebentou… gritaram o Tiago, que parecia estar na cozinha… lembro do “corre Tiago”… creio que tenha sido o mais próximo que cheguei do meu parto vaginal… mas a contração parou e ele subiu de novo.
Daquele momento em diante eu não vi mais evolução. Eu sentia que faria pouca ou nenhuma diferença eu ficar ali fazendo força… e eu já não tinha força… já estava me sentindo fraca. Mas parecia para as pessoas em volta que eu ia conseguir.

Me lembro da minha mãe vindo pra perto de mim quando eu estava no banquinho no quarto chorando e segurando em mim. Me senti muito mal e gritei pra que tirassem ela dali.
Por volta do meio-dia, uma da tarde, eu implorei que não queria mais… eu não tinha mais força para fazer durante as contrações… eu não sentia mais que o bebê
mudava de lugar quando eu fazia força…
Lembro que com minha lembrança ao Tiago de que “eu fui longe demais Tiago… eu nem sei como consegui chegar até aqui” não foram entendidos pelas demais pessoas…
enfim… fomos para o hospital.
Minha doula e uma das enfermeiras foram comigo no banco de trás do carro e me acompanharam. Quando fomos chegando a entrada do hospital eu tenho perfeitamente
a ogeriza que eu sinto da burocracia… me separaram
do Tiago, ele tinha que “preencher os papéis”. De novo… eu sentia desespero de ver que as pessoas em volta pareciam não se importar de eu estar sentada em uma cadeira de rodas gritando de dor. Isso me irritou, mas também acabou de abalar meu estado psicológico. Só consegui me acalmar novamente quando estávamos no quarto escuro, eu, Tiago e minha doula… eu já analgesiada.

Primeiro soco na gestante… alguém passou no corredore chamou minha doula… ela saiu e na volta entrou nomeu apartamento a médica que me acompanhou no meu pré natal, surgida como um fantasma ela entrou no quarto sem meu consentimento. Estava indo acompanhar o parto de outra  paciente. Entrou, se escorou em um móvel a minha direita e desferiu: “viu, eu te falei que com essa equipe eu não faria teu parto. Você vai ter que fazer com a plantonista. Eu vim fazer o parto de outra paciente, não vou poder te acompanhar”. Senti tanta raiva. Quem autorizou aquela mulher a entrar ali? E quem disse a ela que eu estava interessada que ela fizesse meu parto?
Sinto raiva até agora, escrevendo isso…

Ela se foi. Continuamos ali, eu fazendo força quando a contração vinha. Mas o trabalho não evoluía. O Tião não encaixava. A médica plantonista me disse que eu já estava tempo demais em dilatação máxima. Ela me deu mais duas horas para parir ou me encaminharia para uma cesária. Eu pedi ajuda para Tiago e para a doula “vamos fazer esse parto nós três”… não adiantou… as duas horas passaram… o feito da analgesia passou…Tião não encaixou.

Comecei a ter um ataque de pânico quando a dor voltou e me disseram que eu ia pra cesária. Levaram o Tiago embora de novo, e a doula também se afastou. Olhava em volta e só via máscaras cirúrgicas. Comecei a berrar pelo hospital dizendo que estava morrendo, e, como em todo ataque de pânico, eu tinha a certeza que estava mesmo morrendo. As enfermeiras não conseguiam me segurar para a anestesista aplicar a medicação nas minhas costas. Eu pedi para não aplicarem, pois eu não ia ficar quieta. Não tenho ideia de quanto tudo isso demorou. Uma das enfermeiras teve a sensibilidade de falar mais calmo comigo, me alentou. Tiago ainda não havia chegado. A dor já não tinha mais distância entre um pico e outro, era ininterrúpta.

Tiago voltou. Fizeram o corte. Levaram o Tião embora sem encostar em mim. Tiago foi atrás dele.

A médica começou a pedir coisas às pessoas que a estavam
auxiliando. Eu vi que pareciam nervosos. Ninguém me dizia nada. E Tião e Tiago ainda não haviam voltado. Eu sentia algo, como se estivessem me sacudindo por dentro… eu via panos e mais panos ensanguentados sendo jogados num canto no meu lado direito. Tião e Tiago voltaram. Beijei meu filho. Rapidamente levaram ele embora novamente. Tiago foi junto. A médica pediu
com a voz impositiva pra alguém trazer a máquina de raio X. Me fizeram levantar o quadril e colocaram a placa de raio X debaixo de mim. Fizeram o exame ainda ali.

Depois disso, eu ainda atada ao soro e na mesma cama cirúrgica: “tudo que aconteceu aqui nessa cirurgia, 50% é sua responsabilidade”… depois de ouvir isso da médica eu me recordo de ficar atordoada, pois, até então em sabia o que estava acontecendo. Ela seguiu: “isso é resultado das escolhas que você fez”… “em uma cesária marcada e agendada não acontece esse tipo de coisa”… eu pressupus que ela estava falando sobre o fato de eu estar vindo do parto domiciliar.

Mais tarde, eu já encaminhada à enfermaria, em companhia
do Tião e do Tiago, ouvi a médica orientando a enfermeira a observar com mais atenção a minha sonda de urina. Que se houvesse sinal menor que fosse de sangue, ela deveria ser avisada imediatamente.

Depois eu soube que durante a cirurgia meu útero não estava contraindo de volta, eu tive uma hemorragia e ela estava achando que poderia ter cortado a minha bexiga
durante o parto. Foi apenas um temor dela. O exame de raio X e também a sonda limpa demonstraram que não havia corte na bexiga. Meu útero contraiu no pós-operatório ainda no hospital.

Sebastião não pegou meu peito. Mas ficou calmo no quarto. Estávamos calmos e felizes, apesar de tudo. No outro dia uma nutricionista descobriu que ele tinha a linguinha presa, e que não sairia da boca pra fazer a pega do mamá. No outro dia ele foi encaminhado pro centro cirúrgico e uma odontopediatra fez o corte no freio da língua.

Recebemos alta. Fomos pra casa… Tião demorou trinta e dois dias para fazer a pega no peito.

Neste meio tempo, tentamos todas as técnicas possíveis. Ele fará um ano no próximo sábado, ainda mamando em livre demanda.